domingo, 18 de maio de 2014

* O pulo da onça


Biólogos e fazendeiros se unem para facilitar a vida da fera que invadiu plantações do Cerrado brasileiro

Há cinco anos, quando imensas lavouras de cana-de-açúcar começaram a cobrir o interior de Goiás, biólogos logo suspeitaram que a novidade poderia ser fatal à circulação e à sobrevivência da fauna de grande porte, já restrita aos últimos bolsões de Cerrado nativo da região. Ledo engano. Os primeiros resultados de uma pesquisa mostram o contrário. "Onças-pardas e pintadas aparentemente se adaptaram à nova realidade, utilizando as zonas de cultivo como refúgio para se alimentar e até reproduzir", diz Leandro Silveira, diretor do Instituto Onça Pintada*, no município de Mineiros.

Nas plantações, os pumas encontram com facilidade uma de suas presas prediletas: a queixada, um tipo de porco selvagem que sai do mato para comer a cana. Esses bichos vorazes também atacam milharais, mas ali as condições de abrigo são menos atraentes aos predadores. Câmeras-armadilhas instaladas em pontos estratégicos dos canaviais flagraram, além dos felinos, antas, veados, lobos-guarás e tatus-canastra.

O objetivo dos pesquisadores é entender essa convivência e avaliar a necessidade de criar mais espaços protegidos e corredores biológicos para o trânsito da fauna, com a conexão entre as propriedades rurais e o Parque Nacional das Emas - uma ilha de 132 mil hectares de Cerrado conservados em meio ao agronegócio no oeste de Goiás.

"Quanto mais reflorestamos e protegemos nascentes, mais a fauna silvestre se aproxima", conta Maria Fries, produtora de milho e cana. A fazendeira lidera um movimento para a transformação da Rodovia GO-341 em estrada-parque, com sinalização especial, radares e passagens subterrâneas para evitar o atropelamento de animais.

O cuidado se justifica: recém-asfaltada pelo governo goiano, a rodovia bordeja o parque nacional e tem um fluxo crescente de caminhões para o transporte da cana. Outra demanda é a educação ambiental. A presença dos temidos felinos fora de refúgios exige um trabalho de conscientização das comunidades, o que vem sendo feito por uma das grandes empresas instaladas na região, a Odebrecht Agroindustrial.

Ao mesmo tempo, com a diminuição gradual das áreas de pecuária, substituídas pela cana-de-açúcar e outras culturas agrícolas, os conflitos entre fazendeiros e onças que atacavam os animais de criação começam a diminuir. O resultado da trégua é o aumento da população dos predadores, sobretudo em lugares onde há matas bem conservadas por perto.

"Vamos desvendar o recente comportamento da espécie diante desse cenário. Nosso foco será a onça-parda, bem mais comum do que a pintada, mas muito menos estudada", diz Sandra Cavalcanti, do Instituto Pró-Carnívoros, que iniciará o mapeamento do animal no entorno de reservatórios de usinas hidrelétricas nas bacias dos rios Tietê, Grande e Pardo, em São Paulo.
(National Geographic Brasil)

* Instituto Onça Pintada
Parque Nacional das Emas
Instituto Pró-Carnívoros

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