Mesmo que habituada a ler o noticiário da chamada área ambiental, qualquer pessoa sentirá certo desconforto ao tomar conhecimento do teor do último relatório da Agência Internacional de Energia, divulgado em junho, assim como do conteúdo da discussão a respeito no Carnegie Endowment for International Peace, com a presença do economista-chefe da agência, Fatih Birol; do subsecretário de Energia no respectivo departamento norte-americano, Daniel Poleman; do presidente do World Resources Institute, Andrew Steer; e da subsecretária de Política no Departamento de Transporte, Polly Trottenberg. “Se não acharmos solução para o problema das emissões no setor da energia”, disse Birol, “a batalha estará perdida”, já que elas respondem por dois terços do total. “Este é o tema da nossa geração”, segundo Poneman. “Mesmo que limitemos o aquecimento global a 2 graus Celsius, teremos de enfrentar nossa vulnerabilidade, diante dos impactos que já sofremos com os eventos extremos.”
Birol lembrou que, apesar desse quadro, a agenda internacional na área está perdendo o vigor há três anos. Muitos estudiosos pensam que apenas com mais eficiência nessa área se chegará a soluções – mas isso não ocorrerá. E o uso de gás de xisto, sozinho, não resolverá todo o problema. Em 2012 as emissões globais aumentaram 1,4 %, para um novo recorde. No Japão, cresceram 6%. Pequenas reduções na Europa e na Índia deveram-se a menor atividade econômica, sem influenciar a tendência. Talvez o melhor resultado tenha sido na China, embora as emissões ali tenham aumentado 3,8%. Mesmo nos Estados Unidos – pensa ele – o maior uso de gás no lugar de petróleo não se deveu a preocupações com o clima, e sim com o preço. E só temos até 2020 para estabelecermos novos padrões de emissões que nos afastem da atual tendência de aumento da temperatura (que pode chegar, diz ele, a 5,3 graus Celsius).
Curiosamente, Birol acredita que políticas adequadas na área do clima não terão repercussões negativas na economia – embora possa haver ganhadores e perdedores. E não será preciso inventar novas tecnologias, as atuais bastam. Além de permitirem a redução da poluição, diminuirão os problemas da balança de pagamentos com as importações de petróleo. E por esses caminhos se poderá conter o aumento da temperatura em 2 graus – desde que com mais eficiência energética (na iluminação, nos refrigeradores, nas máquinas de lavar, na cozinha), construções mais adequadas. Será indispensável ter motores industriais mais adequados. Transporte eficiente (um terço da demanda global por petróleo vem do consumo em caminhões). Também será preciso proibir a instalação de mais usinas a carvão, muito poluentes. Conter as emissões de metano, até mediante substituição das fontes emissoras. E eliminar subsídios para o consumo de combustíveis fósseis, hoje em US$ 0,5 trilhão por ano, US$ 110 por tonelada de dióxido de carbono.
Se essas coisas não forem feitas, teremos mais secas, ondas de calor, mais ciclones, tempestades tropicais – e com repercussões nas infraestruturas de energia, obrigando até as empresas de exploração de petróleo no mar a elevar a altura de suas plataformas, com altos custos, segundo Birol. Outro caminho será o do sequestro e armazenamento do carbono (no fundo do mar ou da terra) nas fontes emissoras (solução muito questionada pelos geólogos, que temem suas consequências).
Para o presidente do World Resources Institute, “estamos perdendo a batalha na área do clima”, embora haja soluções; e quanto mais demorem, mais caro custarão. No ano passado, US$ 300 bilhões foram investidos na área de energias renováveis – “mas é pouco diante do que precisa ser feito”. E é preciso lutar contra a ideia de que isso é muito caro e pode deixar de ser feito. Se não o for, daqui a cinco anos será inevitável criar um imposto sobre qualquer consumo de combustíveis fósseis, pensa Steer.
Polly Trottenberg acredita estar havendo muito progresso na área da eficiência de veículos, reduzindo o consumo de energia. Já estão em vigor nos EUA novos padrões para carros e caminhões leves, há projetos para caminhões pesados: “Podemos reduzir as emissões e baixar os gastos. E o governo norte-americano está trabalhando com as comunidades para melhorar o uso do espaço, o transporte em geral e o ferroviário em especial”. Depois “chegará a vez do transporte aéreo”, inclusive na redução de emissões.
David Burwell, diretor de Energia e Clima do Instituto Carnegie e mediador da discussão, advertiu que “não há lugar para nos escondermos das mudanças climáticas”. E os fatos recentes parecem dar-lhe razão. No Brasil mesmo, com a seca ainda castigando mais de mil municípios, tivemos nas últimas semanas a decretação de estado de atenção ou de emergência em dezenas deles, por causa do baixo nível de umidade do ar, que em alguns chegou a 12%, com alto risco de incêndios. Inundações graves deixaram mais de mil mortos na Índia. O Alasca teve temperatura recorde, 36 graus Celsius.
Tudo chega a um ponto que levou mais de 500 cientistas de 44 países – entre eles, vários Prêmio Nobel e 33 membro da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos, além de academias europeias – a advertir (Instituto Carbono Brasil, 29/5) que “os seres humanos estão causando níveis alarmantes de prejuízo ao nosso planeta (…). A qualidade humana de vida sofrerá uma degradação substancial até o ano 2050, se continuarmos no caminho atual”. Por causa de perturbações climáticas, extinção de espécies, perda de ecossistemas, poluição e padrões de consumo aliados ao crescimento populacional.
Não faltam advertências, portanto, vindas dos especialistas mais qualificados. Mas quando teremos políticas severas e adequadas, especialmente no caso do Brasil, onde se faz de conta que nenhum problema está acontecendo?
Washington Novaes é Jornalista.
E-mail: WLRNOVAES@UOL.COM.BR
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