Em conferência promovida pelo ICH, ex-ministro da Ciência e Tecnologia Sérgio Rezende discute as possibilidades para o desenvolvimento da energia solar no país e a centralidade da implementação de políticas públicas de incentivo na área.
Por: Marcelo Garcia
Publicado em 25/07/2013 | Atualizado em 25/07/2013
Apesar do grande potencial do Brasil para explorar a energia solar, ainda há pouco investimento do governo nessa área. (foto: Attila ACS/ Flickr – CC BY-NC-SA 2.0)
Um país tropical, abençoado por Deus e rico em energia por natureza – e que, por isso mesmo, deveria fazer mais para aproveitar um de seus mais preciosos recursos naturais: a luz do Sol. Foi o que mostrou o físico da Universidade Federal de Pernambuco e ex-ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, em conferência promovida pelo Instituto Ciência Hoje durante a 65ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Ao derrubar mitos sobre a geração desse tipo de energia, Rezende discutiu as possibilidades de exploração dessa fonte no Brasil e destacou que o avanço da área passa pela adoção de políticas públicas eficientes.
Embora a matriz energética brasileira seja bastante diversificada, cerca de 80% de nossa eletricidade é gerada em hidrelétricas. Na avaliação de Rezende, isso ajuda a explicar o pouco investimento do país na pesquisa de novas fontes de energia. Para se ter uma ideia, ocupamos apenas a 19ª colocação entre os maiores produtores de conhecimento nessa área – são 350 artigos publicados em 2012 contra quase 7 mil da China e mais de 3 mil dos Estados Unidos. “Parece que, por termos tantos recursos hidrelétricos, uma fonte de energia barata, não é preciso investir pesado em alternativas”, avaliou.
O Brasil ocupa apenas a 19ª colocação entre os maiores produtores de conhecimento na área de novas fontes de energia
É verdade que hoje temos três grandes projetos hidrelétricos em implementação: Jirau, Santo Antônio e Belo Monte – esta última se tornará a segunda maior hidrelétrica do país quando finalizada, produzindo 11 gigawatts de energia por ano. No entanto, Rezende argumentou que a demanda energética continuará crescendo e, depois dessas hidrelétricas, quase não haverá mais opções para empreendimentos semelhantes a custos baixos na Amazônia – e, em outras regiões, como o Nordeste, o limite do potencial hidrelétrico já foi atingido.
Nesse contexto, uma das fontes mais promissoras e que pode ganhar espaço na matriz brasileira é a solar. Os números apresentados por Rezende impressionam: no total, a demanda energética mundial é de 150 petawatts-hora (150 milhões de gigawatts-hora). E a energia total que chega à Terra vinda do Sol, em forma de ondas eletromagnéticas, é de 1,5 milhões de petawatts-hora – 10 mil vezes maior. Mesmo que 30% desse total sejam refletidos pela atmosfera e 25% consumidos em ciclos naturais (como o hidrológico, a fotossíntese e a geração de ventos, ondas e marés), quase 50% são simplesmente convertidos em calor – um enorme potencial ainda pouquíssimo explorado.
Explorando o inexplorado
Tecnologias para utilizar essa energia, no entanto, já existem. Uma delas é o sistema de energia solar por aquecimento, que pode ser usado, por exemplo, para aquecer água: ela passa por canos no alto de uma construção aquecidos pelo Sol e por um conjunto de espelhos que retém o calor, de modo similar ao que ocorre no efeito estufa. Outra opção são as torres de energia solar, que utilizam um conjunto de espelhos no solo para refletir a luz solar para um receptor no topo de uma torre. Esse receptor produz gás, que movimenta uma turbina e gera energia.
Mas talvez a maior esperança da geração de energia de base solar sejam as células fotovoltaicas. Feitas de silício, elas transformam a radiação do Sol em corrente elétrica, que pode ser armazenada em baterias para utilização em dias de tempo ruim e à noite. Rezende derrubou alguns mitos sobre essa tecnologia: que seria muito cara e pouco eficiente. “Os custos diretos são maiores, por exemplo, que os da hidrelétrica, mas vêm caindo bastante”, afirmou. “Sobre a eficiência, quando o primeiro painel solar foi criado, em 1975, tinha só 1% de eficiência, mas hoje já se consegue 44% em pesquisas.”
Segundo o ex-ministro, considerando a incidência solar e a eficiência de uma célula fotoelétrica normal utilizada hoje (cerca de 14%), seria possível produzir o equivalente a toda a energia gerada no Brasil cobrindo com painéis solares uma área correspondente a apenas 2,5% da área total de Pernambuco, por exemplo.
A política da energia
Para Rezende, o maior impeditivo para a energia solar é a falta de uma orientação política do governo. “Não temos energia solar porque não queremos, falta decisão política; muitos países europeus que não têm nossa irradiação solar incentivam os moradores a instalar o equipamento, subsidiam sua instalação, dão descontos pela economia”, ressaltou. “Por isso, o Brasil está apenas em 28º lugar na produção de energia solar no mundo, com 27 megawatts produzidos, mil vezes menos que a Alemanha, a primeira no ranking.”
Rezende: O maior impeditivo para a energia solar é a falta de uma orientação política do governo
O físico também destacou a possibilidade de utilizar medidas para atrair o investimento privado no setor, como foi feito com a energia eólica – que hoje conta com milhares de turbinas instaladas pelo Nordeste. “O crescimento da exploração da energia eólica aconteceu após o primeiro leilão desse tipo de energia realizado no país, em 2009, que tornou o mercado mais interessante para a iniciativa privada.”
Um importante passo nesse sentido seria baratear a instalação dos painéis solares, por meio do estímulo à produção nacional ou da criação de mais facilidades para a importação. “Em geral, os equipamentos precisam ser comprados de países como China, Japão, Alemanha e Estados Unidos, com altas taxas, que poderiam ser abrandadas”, avaliou. “Ou, considerando que o Brasil é um dos maiores produtores de silício do mundo, poderia haver um incentivo à produção nacional.” Ele lembrou que o país já teve uma empresa do ramo, na década de 1970, que faliu justamente pela falta de compradores e de incentivos públicos.
Sobre rodas elétricas
Rezende destacou ainda uma mudança no horizonte: a introdução em maior escala dos carros elétricos. Segundo o ex-ministro, apesar de ainda apresentarem algumas limitações, como o tempo de abastecimento mais longo, esses veículos já são uma realidade. “Eles têm muitas vantagens, como a eficiência de seus motores, que chega a 96%, contra cerca de 20% dos motores tradicionais”, analisou. “E o ideal é que sejam associados com fontes de energia 'limpas' como a solar; poderíamos ter, por exemplo, estacionamentos cobertos por painéis solares, onde o carro pudesse ser recarregado com a eletricidade produzida; seria um sistema muito sustentável”, cogitou.
Marcelo Garcia
Ciência Hoje On-line
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