quarta-feira, 24 de julho de 2013

* Cine Teatro Paulo Freire perde salas para o Tribunal Regional Eleitoral

Atores da região fazem manifestação, nesta terça-feira, para protestar contra a ocupação e falta de manutenção do teatro

Fellipe Torres - Diario de Pernambuco
Publicação: 23/07/2013 10:10 Atualização: 23/07/2013 14:25

Único espaço para artes cênicas do município está sem manutenção e com instalações precárias. Foto: Paulo Paiva/DP/D.A Press
Único espaço para artes cênicas do município está sem manutenção e com instalações precárias. Foto: Paulo Paiva/DP/D.A Press


“Isso aqui é assim desde sempre. Não muda nada, não”. As palavras são de Reginaldo José da Silva, há 18 anos zelador do Cine Teatro Paulo Freire, no centro de Paulista, Região Metropolitana do Recife. Em conversa de menos de um minuto, ele revela a falta de novidade no estado de conservação do único espaço para artes cênicas do município com mais de 300 mil habitantes. O patrimônio público está em condições precárias, com teto descascado, cortinas velhas e remendadas, cadeiras desconfortáveis, banheiros quebrados.

Se a piora da infraestrutura é uma antiga conhecida do zelador, recentemente ele testemunhou o que parecia improvável - o lugar onde “nada muda” encolheu. Pilhas de tijolos e vários sacos de cimento isolaram rapidamente três salas anexas, antes utilizadas por artistas e estudantes. “Invadiram nosso campo de trabalho. Esses espaços eram dedicados a música, literatura e ensaios”, diz Cíntia Oliver, do Movimento de Resistência Cultural de Pernambuco.

Atores da região organizam manifestação, nesta terça-feira, para protestar contra a ocupação dos bastidores e falta de manutenção do teatro. Foto: Paulo Paiva/DP/D.A Press
Atores da região organizam manifestação, nesta terça-feira, para protestar contra a ocupação dos bastidores e falta de manutenção do teatro. Foto: Paulo Paiva/DP/D.A Press


Ainda sem reboco, as paredes recém-levantadas escondem as futuras instalações do Tribunal Regional Eleitoral (TRE), cuja permanência no local está prevista por, pelo menos, os próximos 18 anos. Tapumes na fachada do prédio ocultam a obra, autorizada pela administração de Paulista. Para protestar contra a ocupação dos bastidores e a falta de manutenção do teatro, atores da região organizam manifestação nesta terça-feira, a partir das 9h, na Avenida Floriano Peixoto, uma das principais vias do centro da cidade.

“Há quatro anos, o forro do teto do palco caiu em cima do elenco na peça Sítio do pica-pau amarelo. Falta o básico para a gente que é artista e também para os espectadores”, lembra o ator Vinícius Coutinho. Segundo ele, os próprios atores se mobilizam para o teatro ter condições mínimas de funcionamento. “A gente precisa trazer até papel higiênico”, diz.

Os filmes nem chegam a ser exibidos. Fundado há 69 anos, o Cine Teatro deixou de ser “Cine” há três décadas. Ninguém sabe sequer informar o paradeiro dos equipamentos de projeção. Como não há outro cinema na cidade, quem mora em Paulista se contenta em assistir a filmes em casa ou, eventualmente, no Recife.

Teto da instituição sofre com infiltração frequente. Foto: Paulo Paiva/DP/D.A Press
Teto da instituição sofre com infiltração frequente. Foto: Paulo Paiva/DP/D.A Press
Segundo documentação apresentada pelos manifestantes, o Corpo de Bombeiros de Pernambuco atestou várias irregularidades no teatro, como falta de sinalização de emergência, portas adequadas, corrimões e ausência de manutenção nos extintores de incêndio. Já a Agência Pernambucana de Vigilância Sanitária apontou a ausência de placas no forro do teto, má condição do piso e deficiência higiênica nos banheiros, entre outras falhas.

Por meio de nota, a Prefeitura de Paulista afirma que a cessão do espaço para o TRE ocorreu em 2006, na gestão de Yves Ribeiro (PSB), e, embora o prefeito Júnior Matuto (PSB) não esteja de acordo, precisa cumprir com o contrato de comodato, sob pena de sofrer ação de improbidade administrativa. O documento prevê a utilização das salas até 2031, mas o governante está em busca de terreno para ceder definitivamente ao TRE e, assim, reaver o acesso ao anexo do teatro. Quanto às condições precárias de funcionamento, a prefeitura comunica que está captando recursos para realizar melhorias no local até o fim do ano.

A prefeitura do Paulista divulgou nota oficial sobre o assunto:
A Prefeitura do Paulista esclarece que a cessão do anexo do Teatro Paulo Freire, no Centro, ao TRE não foi realizada pelo atual prefeito Junior Matuto. A medida foi fruto de uma negociação firmada e pactuada pelo ex-prefeito Yves Ribeiro, datada de 30 de agosto de 2006, através do Contrato de Comodato nº 62/2006. Na época, o Executivo municipal cedia por um período de cinco anos o espaço que passaria a abrigar os Cartórios das 12º e 146º  Zonas Eleitorais, com a possibilidade de prorrogação de prazo a partir de entendimento entre as partes. 

Passado o período acordado no documento, um termo aditivo, datado de 02 de outubro de 2009, foi celebrado entre a Prefeitura do Paulista e o TRE. O referido acerto prorrogou a cessão do anexo do Teatro Paulo Freire por mais 20 anos, com vigência a partir de 1º de setembro de 2011. Em função do pactuado, até o ano de 2031 o local ficará à disposição do órgão vinculado à Justiça Eleitoral, impossibilitando legalmente o governo municipal de interferir no uso do imóvel. A prorrogação do prazo também contou com a chancela do ex-prefeito da cidade.

No ano passado, o TRE promoveu e concluiu o processo de contratação da empresa para realizar a reforma do prédio. A vencedora do certame realizado em 2012, e finalizado também no mesmo ano, foi a GTA Construções Ltda. O Contrato nº 02/2013, com data de 10/01/2013, firmado entre as partes, não contou com a participação da atual gestão do Paulista, haja vista o conteúdo do contrato de comodato, celebrado em 2006, e do Termo Aditivo, celebrado em 2011, que disponibilizava o anexo, objeto do termo pactuado, para as adequações que se fizessem necessária.

Diante da situação, o prefeito Junior Matuto tentou desfazer o processo, determinando a seus auxiliares que mantivesse contato permanente com o pessoal do TRE. A decisão adotada pelo Executivo municipal era de tentar reverter o acordo, mas a medida poderia trazer implicações graves ao novo gestor da cidade.

Para se ter uma idéia, o dia 17 de abril desse ano, o presidente do TRE em exercício, o desembargador José Fernandes de Lemos enviou ofício ao Gabinete do Prefeito informando que tal postura de inviabilizar a instalação do órgão na cidade poderia obrigar o mesmo a acionar a justiça para o cumprimento do Contrato de Comodato. O documento cita, inclusive, que o TRE estava disposto a dar entrada em uma Ação Civil Pública e Ação de Improbidade Administrativa, esta última com ameaça de perda do mandato eletivo.          

Diferentemente do que tentam propagar pela cidade, no intuito de promover algum desgaste ao governo Junior Matuto, o prefeito já vem trabalhando no sentido de que a posse seja retomada em um prazo mais curto do que o previsto e pactuado pela gestão anterior. Para isso, o mesmo determinou que seus auxiliares promovessem a identificação de um terreno, cujo espaço será transferido ao TRE para que o órgão possa construir, definitivamente, suas instalações na cidade. Com a iniciativa, e já negociado com o próprio TRE, o prédio volta, imediatamente, à administração municipal, inclusive, sem ônus a nova gestão por conta das intervenções físicas realizadas no local.

Paralelamente, o prefeito vem lançando mão de esforços para captar recursos com vistas às intervenções na estrutura do Paulo Freire, proporcionando melhorias no local ainda neste segundo semestre.

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